Célia Ribeiro: "Corpos líricos sob o viaduto Caramuru".
Chamaram ao telefone. E se fosse dez anos atrás, poderia ter sido eu mesma me segredando na secretária eletrônica, como de costume, sobre o mestre
evanescente. Dele, cada gesto ou palavra pediam para ser apalpados, filmados, decorados... Ele bem o sabia, cônscio da efemeridade dos
papéis. Eu, que sempre fui avessa a hierarquias, afeiçoei-me, embora secretamente, sem batismo ou propalação, a ter um mestre assim, para além dos ditos e ouvidos, cônsul das condições paradoxais que se formam em torno de todas as relações. Dele aprendi o nome de
batismo, polindo à água a
pedra do meu nome. Soube-lhe o
nascimento e a paixão do conhecimento. E foi ele quem propôs, um dia, que, num rito de exorcismo, cada um doasse parte de seu nome - aquela que mais lhe incomodasse - e que assim formássemos um monstro utilitário, uma espécie de vodu onomástico, o bode expiatório de todas as nossas vergonhas, recebidas como herança ou marca inesquecível do gosto paterno ou materno. À roda, digo, à mesa dos enjeitados, foram saltando, batizados com cerveja (uma pena, de tão belos!, joões e marias), os tradicionais severinos e sebastianas, os sonoros, inacreditavelmente recalcados, flávio e isabel, os históricos silva e sousa, todos os que traziam cristo no radical, desbravadores de terras e mares, como padilha e maltinti, o poético ribeiro, os compreensíveis pio e vil, e, sob meus veementes protestos, o adorável raimundo - um afã desde as noites em que adolesci sobre as páginas de aluísio de azevedo -, mais a minha penha e o seu batista... Tombaram ali carvalhos, salgueiros e oiticicas. E, viciados todos em estéticas e esteticismos, esmeramo-nos em organizar o nome estratosférico do nosso frankenstein, a fim de dar-lhe alguma decência. Concluído o serviço, concordaram quase todos que, retirados de nós e lançados à figura imaginária pela qual, na hora da saideira, nutríamos já alguma simpatia, o nome, resultante de tantos esquartejamentos embora, soava incrivelmente agradável aos ouvidos, bonito, raro e nobre. Mistérios do deslocamento. O garçom se aproximou e apresentou enfim a nossa conta. Assustamo-nos. Seu nome era Frank Stein.
Vistos de fora até os fantasmas se humanizam...
ResponderExcluirTenho intuido que alguns filmes como 'beleza americana' de sam mendes ou 'coisas simples da vida' de edward yang, para citar o q está na memória ativa, indicam uma tendência de apaziguamento de um cotidiano menosprezado, e de exorcismo de possibilidades apontadas e negadas no passado.
A partir de um distanciamento, o cotidiano apalpado com delicadeza ressurge em uma dimensão especial ao mm tempo particular e coletiva.
Seu texto lincou-me ao que tanto me agradou nesses filmes, sobretudo o do yang.
Saudades do mestre! e brinde à nossa (o trio) amizade!
Belo texto!
Rambo...
ResponderExcluirPercebo, em sistematizações e poucos pesares, a inexistência de um passado firme e, ao mesmo tempo, iniquamente perfeito ao qual o personagem, em sua busca incessante e desesperada do encontro do seu eu-interior, sofre o privamento de sua felicidade e particular privação do seu passado.
A partir de um momento de percepção da periculosidade envolvida no ato despachado em uma faixa de madeira, por vezes conhecida como a "mensageira do destino", vê-se que o cotidiano delineado por momentos férteis e, não obstante, capazes de transformar a mais simples sanidade em loucura, ao mesmo tempo insensata e sã.
É lançada!!! Percebe-se que, ao contrário do que parecia ser a verdade secreta, os povos, vindos do Asia Menor, não se compreenderam unica e exclusivamente ao ato momentêneo da observação. Percebe-se que, a partir de um momento de distanciamento do ato de guerra, esses povos sofrem sentem, mortalmente, a "mensageira do destino", trespassando sob suas superficies pensantes e, inevitavelmente, suportadoras de seus fios capilares.
RESUMINDO: Rambo lança flexas nos Vietnamitas. =D
Seu texto lincou-me à natureza poética e, quem diria, multicultural do espaço finito na atmosfera infinita do vento e do tempo/espaço.
Saudades suas professora,
Abraço.
Adriano, menino! O que que cê anda tomando?
ResponderExcluir=D
ResponderExcluir23/02 é meu aniversário...
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