"... já disse, é tudo verdade, mesmo ou sobretudo o que invento... só a ficção está de fato apta a prestar contas do real..." (Evando Nascimento)
Como pode ser assim, isso de escrever?
Às vezes é tão imenso o deserto imaginário, que as palavras vão saindo dos dedos feito as lebres de um ilusionista, orelhas fora da cartola, carentes de sentido, olhando em volta sem nada entender do barulho do teclado aplauso e das luzes do estranho palco monitor.
E ainda assim desponta, em algum lugar, alguém que, numa noite de chuva como a deste atípico fim de outubro, nos leu...
Na verdade (e ainda há quem ria do fato de eu duvidar também disto: a verdade)... na verdade apanhei um cigarro para escrever ao namorado ausente, sobre como as suas mãos, talhadas no movimento de amaciar o ferro, decoravam o ângulo italiano do meu nariz.
A lista de romantismos resultaria interminável - e mesmo inútil - entre tantas resenhas a revisar, mamadeiras sujas, pequenos contratempos cotidianos e, ainda por cima, a empregada pedindo as contas...
Esta não pode ser uma noite comum. Primeira medida: cortar os cabelos longamente cultivados. Segunda primeira medida: mudar o toque do celular, driblando a náusea da espera. Terceira primeira medida: olhar duas vezes antes de cruzar o sinal.
No quarto contíguo dormem as crianças, entre lobos maus... Esta noite não é mesmo comum.
Deixarei para chorar amanhã, na cadeira do dentista.
Nenhum comentário:
Postar um comentário