Eu jogo com palavras. É a minha vida. (Philip Roth)
As dissidências entre real e imaginário... Mas, como mesmo? Como assim? Só se pode imaginar o real - ou não? Só se pode realizar o imaginado, certo? Ah, é pensamento sem fim, não há que separar ou juntar nada, não se trata de instâncias...
Alex leu o texto ilustrado por foto sua, e, assim que nos encontramos, perguntou sobre aquela passagem que eu omiti. "Qual?", indaguei. E ele: "Você não se lembra mesmo? Ah, queria eu ter esquecido!". E me narrou algo já completamente apagado da memória: "Eu, com pena do pássaro, devolvi-o ao ninho assim que os colibris o lançaram ao chão! Fui eu o responsável pela morte do bicho!".
E assim se revelou, de todo o acontecido, o fato que, aparentemente, forneceria a melhor matéria para a escrita. Aquilo que daria à crônica o bom desfecho foi simplesmente esquecido. Marcou-me tanto a conspiração extra-espécie para salvamento do pássaro que não me lembrei absolutamente da nossa interferência. Ou então a mente arquitetou um mecanismo de menos-culpa, para o prosseguimento suave dos nossos dias de férias.
Imagino quanto esquecimento, quanta deturpação... na verdade a impossibilidade sem tamanho de recuperarmos o dito acontecido. Aliás, não deve ter sido por acaso que a palavra dito começou a penetrar em certos lugares...
E olhe que tirei tanto prazer de relembrar o relatado! Gostei especialmente de replantar no texto o pomar inteiro de mamãe, e, quiçá, frutas que lá nunca existiram...
Agora há pouco, ao relê-lo, senti o cheiro do manjericão vindo direto do canteiro... Senti nas mãos a casca grossa das sementes do girassol... Tive nos dentes a trava azeda do maracujá...
Mas me esqueci de que Alex, entre condoído e confuso, apanhou no chão de terra o pequeno pássaro e devolveu-o, cuidadosamente, ao ninho, entregando-o, em suas mãos, ao apetite peçonhento do destino.
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