quarta-feira, 27 de março de 2013

No céu da boca


Joan Miró: Blue II.
 
Eu tinha ido apanhar o resultado de uma radiografia. Estava apreensiva, achando que descobriria algum problema, e pensava: a cabeça foi o único órgão que releguei ao esquecimento. Por que a negligenciei? Constantes exames de todas as outras partes, e ela abandonada há tanto tempo! Antes que o envelope fosse aberto, sugeri ao médico que fizesse logo uma tomografia. Pareceu-me ver o desenho de um tumor oval numa das chapas que ele analisava à minha frente, diante de um foco de luz. O homenzinho não conseguiu esconder sua preocupação com o que viu. Disse imediatamente, como se a doença tivesse sido previamente diagnosticada: “O tumor já se expandiu do céu da boca para a área superior da cabeça”. Ia falando e perfurando o papel com um palito grande, de madeira. Era como uma fotografia colorida e lá estava a mancha. Comecei a imaginar, desesperada,  o que faria para controlá-la. Ele disse que usufruíamos de medicamentos fortes, hoje em dia. Tive medo dos efeitos colaterais.

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