Arcimboldo: O bibliotecário.
Realmente, como dizia Yourcenar, cada lugar tem seu perfume. Mesmo depois de alguns anos em contato com o cerrado, respirando o onipresente cheiro adocicado de fruta conservada na casca, a aragem úmida de Vitória ainda me entontece, conturbando por vezes os sentidos. Foi sob essa constatação que cheguei à livraria.
E ontem foi mesmo um dia excepcional: a loja estava fechada para balanço, mas o livreiro, velho conhecido, me convidou a entrar. Como os poucos funcionários se encontravam no andar de cima, desenvolvendo seus cálculos de fim de ano, pude circular com tranqüilidade pelo pavimento inferior, deserto e em completo silêncio. Não buscava nada em especial, queria mesmo era reviver algumas sensações. E estava envolvida com as lombadas pouco familiares da estante de Direito quando me assustei com o peso de uma mão no ombro, virando-me no susto e vendo ali materializado o professor Renato Pacheco, largo sorriso aberto à minha frente.
A princípio não soube o que dizer, menos pelo fato de sabê-lo não mais entre nós do que pela minha natural timidez, que impede certos arroubos afetivos, mesmo no reencontro com grandes amigos. E de repente, tentando resolver meu acanhamento, abracei-o, talvez exagerando um pouco ou, a quem nos visse de fora, parecendo que eu simulava uma intimidade que na verdade nunca existiu. De todo modo, eu queria, precisava sentir o seu abraço caloroso no meu retorno a esta cidade.
Nenhum comentário:
Postar um comentário