segunda-feira, 14 de março de 2011

A barata

Parece que tivemos a mesma idéia, ela e eu. Ou então ela tinha sido atraída pelo escuro do closet e, quando acendi as luzes do quarto, veio saindo para o corredor, em minha direção, com uma cara de quem resmunga por se lhe ter lançado no rosto o clarão.

Foi a única coisa que tive tempo de imaginar antes que um arrepio me percorresse o corpo inteiro.

A primeira idéia que me passou pela cabeça foi a de chamar o Francisco para que a eliminasse. Foi muito rápido, então me lembrei de que ele só tem três anos e, como de outras vezes, corri para o quarto ao lado e fechei a porta sobre mim. 

Em algumas ocasiões já dormi na cadeira do escritório ou no sofá da sala por causa de uma barata, mas acontece que da última vez que uma delas entrou em minha casa, eu ainda não tinha filhos.

Agora a simples idéia de que a cascuda, com suas garras renitentes, pudesse percorrer as costinhas macias e indefesas, me encheu de uma raiva que venceu o pavor.

Corri para a despensa e retornei armada. Morreu a golpes silenciosos e certeiros de uma vassoura velha e enfim foi lançada no asfalto, da janela do oitavo andar.

Como em outras situações limítrofes, não houve jeito de que não me imaginasse olhando de fora, durante a realização mesma da cena toda: via a máscara de guerra que foi preciso traçar no rosto para empreender a batalha contra o medo e o nojo, os pêlos eriçados nos braços e os silenciados urros guturais transformados em surdas interjeições para alimentar o feito.

Algumas vezes é preciso matar.

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