terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Mortos vivos

Frida Kahlo. Sem esperança.

Andei pelo cemitério, contemplando: os mortos eram todos enterrados da cintura para baixo, de pé ou sentados, apenas o tronco e a cabeça apareciam sobre as lápides.  Tive a impressão de que alguns mexiam o dorso, e a certeza de que os cabelos continuavam a crescer após a morte, porque todos os traziam demasiado longos e bastante empoeirados. No momento seguinte reconheci, a partir da cabeleira densa e longa, eu mesma, em uma das tumbas, e passei a sentir a angústia profunda de não estar mais viva, mas de também não estar completamente morta, podendo movimentar apenas parte do corpo, e ter de estar assim para sempre. Olhei na tumba ao lado e reconheci a cabeça do Cristo, como a que aparece em muitas gravuras medievais. Virou-se para mim e piscou-me o olho, num sinal de cumplicidade que antes me encheu de pavor.



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